terça-feira, 15 de novembro de 2011

CAMINHOS DE SELTON

2011

Duas ou três perguntas para começar:

O que terá levado Selton Mello a dirigir dois filmes tão diferentes como Feliz Natal e O Palhaço?

O que fez Feliz Natal fechar carreira com minguados 28.759 espectadores, enquanto O Palhaço vai rompendo a faixa dos 600.000 em sua segunda semana de exibição?

O que acontece quando um artista procura afastar-se de si mesmo e quando retorna a si mesmo?

Não li nenhuma entrevista de Selton falando sobre essas questões. Estou refletindo por minha conta e tentando criar um entendimento comigo mesmo. Lembro que Selton andou questionando-se, há poucos anos, sobre a persona que estava criando no cinema e a frequência com que vinha aparecendo nas telas. Chegou a passar um tempo recluso. Quando dirigiu Feliz Natal, certamente procurou um tema e um tom que nada tivessem a ver com a imagem de garoto meio esperto, meio bobo com que o público o identificava. Algo que ficasse a léguas de distância de Chicós, Leléus e Johnnys.

Pois bem, Feliz Natal era um antípoda disso tudo. Lúgubre, áspero, angustiado, tratava de um acerto de contas pessoal e familiar em chave de drama pesado. Em matéria de estilo, buscava uma aproximação com o cinema de arte dos anos 2000, especialmente O Pântano, de Lucrécia Martel, e Lavoura Arcaica, no qual atuou esplendidamente, mas em padrão distinto do habitual. Selton não participava do elenco, o que era uma forma explícita de afastar-se de si próprio. Almejava talvez reinventar-se como cineasta “sério” e artisticamente ambicioso. O filme agradou a muitos críticos (eu fui exceção), mas não dialogou nem com o público de Selton, nem com o do filme de arte.

Não chego a afirmar que O Palhaço seja uma correção de rumo na carreira do cineasta. Mas é evidente que o caminho do novo filme passa por paisagens radicalmente distintas. A começar pela presença do Selton ator, voltando ao tipo de personagem que inicialmente o consagrou: o meninão meio caipira, meio desengonçado e sonso, mas cheio de carisma. Depois, pelo ambiente rural ou provinciano, conivente com uma proposta de espetáculo mais popular, assim como o circo. A ideia de um grupo em dissolução (a família disfuncional) é trocada pela de sobrevivência e renovação do grupo (a família circense). A comédia básica e a amabilidade entre os personagens substituem o drama depressivo e as relações ríspidas. Veteranos astros da comédia popular tomam o lugar de um elenco “cult”. A palheta de cores é mais colorida e quente. A música varia entre o nino-rotiano e o brega brasileirinho.

O Palhaço sugere uma volta de Selton Mello a um lugar conhecido e aquecido. De alguma forma, um regresso a si mesmo – ou ao que dele se espera. Não faltam pequenas ousadias nem pequenas concessões em mais esse conto do palhaço triste. Embalado agora por uma reconciliação do diretor com o público, quem sabe Selton poderá caminhar para o que realmente quer fazer por trás das câmeras. Nem tanto ao mar, nem tanto à terra, quero crer que o meninão ainda vai fazer o seu grande filme muito em breve.

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